O presidente
norte-americano Barack Obama pediu ao Congresso do país uma autorização para
iniciar oficialmente uma intervenção militar no Oriente Médio contra o Estado
Islâmico. Para fugir das armadilhas e complicações de uma intervenção e
ocupação prolongadas, como na Guerra do Iraque, Obama determinou o prazo de
três anos para a nova operação militar. Mesmo com o apelo de parte da opinião
internacional; em diferentes discursos na ONU, Dilma Rousseff, que foi muito
mal interpretada na imprensa brasileira, e Kofi Annan, que identifica essas
intervenções militares como propagadoras do extremismo, principalmente pela
malfadada Guerra Ao Terror, encabeçada pelos Estados Unidos.
Sem dúvida, essa leitura dos fatos está sendo
cada vez mais comprovada com a sequência de acontecimentos no complicado
tabuleiro de xadrez político e religioso do Oriente Médio. No entanto, parece
que estamos diante de uma encruzilhada e devemos optar por um caminho, mas
nenhuma das opções parece ser muito promissora. Para auxiliar nessa tarefa, é
sempre interessante recorrer à História, procurar paralelos históricos que
possam ajudar a entender o momento atual, bem como dar algumas pistas para o
que pode acontecer. Ao utilizar esse recurso, não estamos dizendo que ambos os
momentos são os mesmos, iguais, apenas procuramos similaridades e traços que
possam ajudar a fazer uma análise dos fatos mais ampla.
No caso do Estado Islâmico, é possível fazer
um paralelo com o Período Entre Guerras (1918-1939) e, nesse contexto,
especificamente a ascensão da Alemanha Nazista na década de 1930. Na Primeira Guerra, o mundo testemunhou toda
a devastação que a modernidade poderia trazer à época. Tanto os países vitoriosos
quanto os derrotados ficaram profundamente marcados e traumatizados por essa
experiência. Na Europa devastada e vitoriosa, a França era a que mais tinha
sentido o avanço alemão e a que mais queria conter o seu poder militar,
resultando no Tratado de Versalhes, que responsabilizou a Alemanha pela guerra,
o que fez recair sobre ela duras penas e condições, desde indenizações vultosas
quanto a redução e o limite do seu poderio militar. Somado a isso, a Grande
Crise Econômica de 1929 desmanchava qualquer esperança de reestruturação. A tal
humilhação, diante dos olhos do povo alemão, foi o germe do nazismo,
capitalizado por Adolf Hitler, que chegou ao poder em 1933. O regime totalitário nazista não demorou
muito a dar claros sinais de que seria um perigo real para a Europa pós-guerra.
Aliado a políticas internas de abolição de direitos e perseguições de minorias,
a política externa já apresentava claros sinais de expansionismo, indicando que
a Alemanha havia deixado de cumprir as condições do Tratado de Versalhes. Em
1936, a Alemanha de Hitler desempenhou um papel de destaque na Guerra Civil
Espanhola, em apoio ao nacionalista Francisco Franco. Em 1938, a Áustria foi
anexada e, finalmente, em 1939, foi a vez da Polônia, desencadeando de uma vez
por todas a Segunda Guerra Mundial. Enquanto isso, a Europa, principalmente,
Inglaterra e França, calava-se, guiada pela política de apaziguamento, diante
da memória ainda fresca dos estragos da Grande Guerra. Em 1939 a situação ficou
insustentável e teve início a inevitável Segunda Grande Guerra.
Mas o que isso
tem a ver com o que estamos passando com o Estado Islâmico? Bem, a Guerra ao
Terror, como já disse aqui, foi nitidamente um fracasso, espalhando e às vezes
financiando movimentos extremistas por onde passou. O EI, um braço da Al-Qaeda,
é uma cria direta desse processo na Guerra Civil da Síria. No entanto, o
estrago já está feito e tomando grandes proporções, por isso o avanço do dito
califado tem que ser visto à luz da ascensão da Alemanha Nazista na década de 1930.
Além das nítidas e ultrajantes violações aos direitos humanos, a essência do
Estado Islâmico é o expansionismo, nesse caso “religioso”. Ou seja, já está
dito claramente que ele não quer apenas conquistar um território e desenvolver
uma nação soberana; não é o bastante; ele quer expandir-se e criar uma única
comunidade religiosa. Devemos esperar que ele invada e anexe, um por um,
pedaços de Estados já despedaçados no redemoinho do Oriente Médio? Ou vale a
pena cair no erro de intervenção militar direta mais uma vez, a fim de impedir
que esses crimes contra a humanidade tomem proporções ainda maiores? Além disso, ainda há uma inundações de jovens
europeus perdidos, desempregados e sem esperança, devastados pela Crise
Econômica de 2008 – tida como a pior desde 1929 – e suscetíveis à lavagem
cerebral ideológica que passam a integrar as forças militares do Estado
Islâmico.
Bem, a História está aí para nos apresentar
indícios e indicar caminhos. Parece claro que a política de apaziguamento
novamente não irá funcionar, arriscando-se a surgir um Estado tão terrível
quanto a Alemanha de Hitler. Ao mesmo tempo, deve-se evitar que essa
intervenção, que é necessária, passe a ser uma ocupação efetiva de contingentes
militares nos países invadidos. Essa foi mais ingrediente para a já secular
humilhação e indignação que sentem os árabes e muçulmanos diante do
intervencionismo ocidental.
FONTE: Intervir ou não Intervir? Eis a questão - Por André Espínola